A virada

Eram umas dez e meia da noite quando recebi a mensagem. Faltava pouco para a entrada do novo ano. Algo naquele dia já me dizia que não seria um dia comum; se bom ou ruim ainda não saberia dizer, mas mudaria muita coisa. Tinha tomado meu banho e celebraria mais um ano da forma mais matuta possível, em casa, repousando sobre minha linda e tão amada cama. E não é ironia, de fato é algo prazeroso. Mas aquela mensagem mudou o curso das horas. Era uma mensagem dele. Já estávamos nos entendendo a um tempo e, pela minha “listinha”, ele atendia a muitas das características que eu buscava em alguém. Mas desde o Natal, eu já o sentia um pouco diferente, estranho. Queria ficar com “o pé atrás”, mas a certeza que ele me dera foi tanta, que pensei: deve ser algum problema familiar, espero que nada de ruim aconteça, afinal, é Natal!

Na mensagem, uma névoa. Frieza e pouca visibilidade. Não o via, não o reconhecia naquelas palavras. Ele tentava me dizer algo mas parecia custoso. Até certo ponto eu não o compreendia verdadeiramente. Ao passo que, como num Djavú, sabia exatamente onde ele queria chegar. Não sei ainda se meu coração é teimoso ou corajoso, por mais que havia entendido, se esforçava por saber mais, ir ao fundo do que estava acontecendo. Eu podia ter dito, ok. Teria gasto menos tempo  fazendo-o arrancar de si mesmo uma hombridade que lhe fugia. E, por mais que eu o questionava, nenhuma resposta que me soasse verdadeira, nenhuma palavra que me fizesse entendê-lo. Depois de horas conversando pelo telefone, entre mensagens trocadas e lágrimas caídas, eu já não sabia se havia me secado do banho ou não. Uma coisa me ficou gravada de tudo o que ele disse, que eu era uma pessoa maravilhosa, perfeita demais, ou quase isso. Que de todas as coisas que ele ouviu sobre mim, todas eram boas e belas. Obviamente eu o exortei, quanta desculpa para sair da vida de alguém. Quanto clichê numa frase só. Depois dessa eu me fechei. Deu um pane na minha cabeça. Por que alguém sairia da vida de outra com tantas qualidades? Com tantos atributos? Somos tão medíocres a ponto de nos contentar com o pouco que nos oferecem? Pane total!

Eu entendi o recado. O novo ano estava para chegar e eu encharcada, quem me dera se fosse pelas ondas do mar naquele momento. Eu chorava. Não pelo fim de algo que tem essa probabilidade, mas pela forma. Pela segunda vez me sentia a pessoa mais insignificante do mundo. Não fui digna nem de um olho no olho, da presença. De todas as formas que ele podia fazer isso, ele escolheu a que mais me doía; de me decepcionar com alguém que eu estava disposta a amar. E ele não foi. Não foi sincero em dizer o que se passava, não foi claro quando precisou ser e acima de tudo, não foi homem para se despedir. Ficamos eu e todas as dúvidas que eu poderia ter.

As pessoas têm uma capacidade tremenda em se apresentar, em dar boas vindas e serem esplêndidas na chegada. Mas quando se trata de partir, de deixar rastros elas se perdem. Caem no erro de achar que a indiferença resolverá tudo e que se afastando será a melhor escolha. Confesso que para mim não! Não sei olhar para trás e ver que minhas pegadas não foram firmes, que lá atrás tem uma névoa onde não enxergo o que deixei. Não quero olhar para trás e ver portas fechadas e corações endurecidos pela frieza.

O ano virou e eu nem vi, nem percebi. Só sei que chegou e de cara me mostrou que não seria um ano de poucas emoções. Eu só não esperava que viesse tão prontamente. Não sei mensurar o quanto em mim doeu aquela partida, não a dele, mas a deixada em meu coração pela indiferença. E aos poucos eu vi que era verdade o que ele falou sobre mim. Não que eu fosse perfeita, tampouco inatingível. Mas que eu era boa sim e que merecia ao menos a consideração que ele não teve. E que o amor despendido de mim, não caberia numa tela de celular.

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