Prédio 0880

Metade, cara. Não, espera! Não é por inteiro? Certeiro. Perguntou o porteiro para àquele rapaz que, fugaz, desviou o assunto. Sabia ele que mentia, fingia para si. Buscava o amor perfeito fingindo ser homem direito. O porteiro experiente que só, com o monitor ligado, tudo via pela guarita. Alertava as moças que por ali passavam e, olha, cada alma bonita!

Um dia, distraído, não viu passar esse rapaz. Acreditou que tinha aquietado e, com sorriso de lado, suspirou aliviado. Mas o rapaz havia saído de fato, desta vez, sozinho. Foi lá para as bandas do rio claro, recordou as palavras do porteiro – Inteiro?! Desacreditado que ainda lhe restava coragem, pegou na carteira um contato. Era de uma moça que tinha conhecido e ficara apaixonado; o medo de entregar tudo que tinha o fez ir embora. Levou consigo o olhar da moça que nada pode compreender.

Com o contato na mão, sentado no banco, imaginou como teria sido. Fechou os olhos frente às águas e admirou-se. Era bom o que via, mas ele sabia que era apenas imaginação. Subitamente abriu os olhos, amassou o papel de suas mãos, já não existia mais chance dessa história; tempo demais havia passado e pelo curso natural da vida, cada um havia tomado rumos separados.

A manhã passou e ele para o prédio retornou, cumprimentou o porteiro e desta vez ele quem revidou: – Inteiro? É, meu caro! Difícil ser metade, quem escolhe viver assim nunca saberá o que é um amor de verdade. Acho que nos veremos pouco a partir de agora! O porteiro entendeu, embora curioso para saber o que tinha mudado. Mas ficou ali, o monitor ligado e com o sorriso escancarado.

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